O anteprojeto de reforma do Código Civil promete alterar de forma profunda as regras sobre sucessão no Brasil e um dos pontos mais sensíveis é justamente o papel do cônjuge sobrevivente. A advogada Mariana Parreira, especialista em Direito de Família e Sucessões, alerta: “Se antes a lei garantia uma proteção automática, agora será o planejamento sucessório que vai determinar o futuro do patrimônio familiar”.
Segundo a proposta, o cônjuge ou companheiro deixa de ser considerado herdeiro necessário. Na prática, isso significa que ele só terá direito à herança em situações residuais ou se houver previsão em testamento. “É uma mudança de paradigma. O sobrevivente não fica desamparado, porque há salvaguardas como usufruto judicial e direito real de habitação, mas a proteção deixa de ser ampla e passa a depender de decisões tomadas em vida pelo casal”, explica Mariana.
Impactos diretos nos regimes de bens
As implicações variam conforme o regime adotado no casamento. Na comunhão parcial, por exemplo, o cônjuge tem direito à meação, mas não necessariamente à herança. Já na separação total, ele só terá acesso se não houver descendentes ou ascendentes, ou se for contemplado por testamento. “Ou seja, o que antes era assegurado pela lei passa a depender de escolhas conscientes e antecipadas”, reforça a advogada.
Novos cenários e maior autonomia
Além dessa mudança estrutural, o anteprojeto traz outras inovações importantes: reconhecimento de bens digitais como parte da herança, equiparação de uniões homoafetivas e famílias pluriparentais, possibilidade de alteração do regime de bens durante o casamento e até a priorização de herdeiros que cuidaram do falecido.
Outro ponto de destaque é a ampliação da liberdade do testador: “Hoje é preciso justificar restrições como inalienabilidade ou impenhorabilidade. Com o novo texto, a autonomia será plena, sem necessidade de justificar a decisão. Isso fortalece a estratégia de proteção patrimonial”.
O projeto também inova ao incluir o abandono afetivo como causa de exclusão da herança. Parentes que negligenciam deveres familiares poderão ser afastados judicialmente da sucessão. Para Mariana, esse é um avanço importante: “A herança deixa de ser apenas um direito patrimonial e passa a refletir também valores éticos e relacionais”.
Com tantas mudanças, Mariana Parreira é categórica: “Famílias que antes confiavam apenas na lei precisarão se planejar. Testamentos, doações, holdings familiares e pactos antenupciais ganham relevância”. O anteprojeto valoriza a autonomia privada, mas exige responsabilidade. Quem não se preparar pode deixar o patrimônio vulnerável. “É importante destacar que a proposta ainda está em análise no Senado e, caso seja aprovada, passará a valer para todos os tipos de regime de bens, sem distinção da data do casamento. Como a sucessão só se concretiza no momento do falecimento, será aplicado o código vigente à época do óbito, e não aquele em que o casamento foi realizado. Essa mudança pode gerar impactos significativos no planejamento patrimonial de famílias e empresas”.





